O actual governo está em funções há menos de três meses.
É pouco tempo para retirar conclusões definitivas mas tempo suficiente para perceber algumas coisas. Desde logo para, no que respeita à equipa, se perceber onde estão os bons reforços.
Já se percebeu que à frente das Finanças está um excelente técnico acompanhado por uma equipa de Secretários de Estado de grande nível. No entanto, dada a natureza da missão e o estado do país não é crível que, no dia em que essa equipa sair, os portugueses dela guardem boas memórias. É da natureza das coisas. O que se pede a este Governo é que, ao contrário de outros que o antecederam, governe a pensar nas próximas gerações e esqueça as próximas eleições.
A geração de que faço parte viverá pior que a dos seus pais e terá de ter o espírito de sacrifício dos avós e bisavós. Parece que vivemos circunstâncias únicas mas em boa verdade já passamos por isto. Em 1892 Portugal não conseguiu honrar os seus compromissos e esteve mesmo na bancarrota. Foram precisos anos, largos, até colocar défice e dívida em ordem mas o país sobreviveu ao empobrecimento e retomou o rumo.
Na ressaca das eleições muita gente coincidiu na ideia de que, ao contrário das eleições de 2009, valeu a pena não embarcar em grandes promessas. Não se pode já, passados menos de três meses e dois mil milhões de buraco orçamental imprevisto depois, colocar tudo em causa.
Dito isto, parece-me que das medidas concretas que constam do Documento de Estratégia Orçamental para os próximos anos há uma que oferece particulares dúvidas quanto à eficácia real, sem esquecer a posição de princípio. Acabar com as deduções fiscais na saúde e educação para os contribuintes dos dois escalões máximos pode propiciar um aumento de pagamentos feitos sem factura e, por essa via, perdas de receita para o Estado.
Por outro lado, se pensarmos que o segredo da nossa recuperação económica residirá muito na capacidade das nossas empresas exportarem mais, rapidamente nos capacitamos de que a evolução económica nos países com os quais nos relacionamos economicamente irá ditar muito do nosso crescimento potencial e da nossa capacidade de sair da recessão.
A incerteza dos momentos que vivemos exigirá que façamos a nossa parte do que está acordado mas também que tenhamos a sorte de contar com uma economia europeia e mundial sadias.
Para que o doente não morra da doença de sobreendividamento ou défice orçamental desequilibrado, nem morra da cura de ajustamento orçamental duro e concentrado no tempo que nos está destinado, fruto dos compromissos internacionais, todas as medidas que permitam às empresas respirar são benvindas.
A moratória de um ano na amortização de empréstimos concedidos às empresas que acederam ao PME Investe é, pois, uma medida positiva.
Mas é preciso mais. É preciso que o Estado comece a pagar às empresas a tempo e horas e dê, também ele, o exemplo.
Uma última nota: dizer-se que 2012 será o princípio do fim da emergência que vivemos é uma frase perigosa e, senão devidamente explicada, pode criar falsas expectativas. Outros o disseram imprudentemente no passado, até mesmo noutras paragens, e, cedo ou tarde, pagaram as consequências em termos de credibilidade.
A crise que vivemos é uma crise cuja resolução levará anos. Para não falarmos de défice orçamental, sempre muito mais "mediático" que outros indicadores, atente-se nos valores insustentáveis de dívida pública, dívida das empresas e dívida das famílias, cuja desalavancagem tomará o seu tempo.
Comunicar bem, sobretudo num contexto de dificuldades excepcionais, é fundamental. Não gerar falsas expectativas, nem exagerados pessimismos, é o primeiro passo para se voltar a gerar confiança no sistema. E todos sabemos o quão importante é a confiança e a estabilidade fiscal para um clima favorável à produção de riqueza, geração de investimento e criação de postos de trabalho.
Nuno Reis
Uma versão deste artigo foi publicada em "O Primeiro de Janeiro", no "Diário do Minho" e no blog do deputado
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